A Ação de "Personalidades Intrusas" 

 A Obsessão


 

A civilização contemporânea é uma "civilização de conflito", baseada essencialmente no choque de entidades individuais ou colectivas.

Ora, a luta, em vez de acalmar os espíritos, tende a excitá-los, gerando conflitos variadíssimos. Tem-se dito, por exemplo, que o desporto - um assunto actual - canaliza o instinto de luta e agressividade, permitindo "descargas" benéficas. No entanto, quando o desporto assume a forma de competição, especialmente quando associado a interesses financeiros, degenera em conflito. Será, então, caso para perguntar:

- Os campeonatos e competições não reforçarão, pela repetição, os instintos de agressividade? Não excitarão os ânimos em vez de os acalmar? Não agravarão inimizades?

Essas emoções, assim violentas e repetidas, não têm aquele efeito de "descarga". Em vez disso, o homem torna-se facilmente, por causa delas, um "exterminador sistemático", implacável.

Movimentando-se nesse terreno de competição, como o é também a própria vida diária, cada pessoa manifesta violência de modo diferente, em graus também diferentes, devido a factores diversos, como o grau evolutivo de cada um, o momento que vive, etc.

Há pessoas com forte autodomínio - que é um dos objectivos que devem ser conquistado na vida física - que conseguem travar a influência que recebem do meio em que se movimentam. Os menos prevenidos ou menos conhecedores da forças que governam a vida poderão funcionar como "receptores" passivos e manifestar-se até de maneira explosiva, fulminante, tempestuosa, chegando a reacções de cólera 1 . Ora, a cólera provoca uma verdadeira anestesia do espírito, como o povo reconhece implicitamente quando usa expressões como estas: "estava cego pela cólera", "estava fora de si", etc.

Em tais situações a pessoa passa a agir como se fosse outra. Ocorre então perguntar, também, se pode alguém actuar independentemente da sua própria vontade, agindo como se fosse uma personalidade distinta. A resposta é "sim".

Conhecem-se até casos de pessoas que apresentam, em alturas diversas, personalidades distintas, que lhes controlavam, alternadamente, o corpo. É uma perturbação do espírito a que se chama "obsessão".

Antigamente, estas perturbações mentais eram consideradas como formas de inspiração divina ou de possessão diabólica. Hoje em dia a tendência é para as relacionar com factores físicos, químicos e emocionais.

No mundo oriental, a convivência com a ideia das possessões e das reincarnações é ponto assente. Não se discute. Entre nós, pelo facto de o fenómeno não ser estudado, ou de o ser apenas teoricamente, é mais fácil aos cientistas dizerem que ele não existe ou que se trata de manifestações do inconsciente! Falar de possessão parecerá uma tentativa de regresso às mais antigas interpretações a respeito das doenças mentais, uma agressão até aos preconceitos de natureza científica dos últimos séculos.

Mas, na realidade, se a experimentação vale alguma coisa, nada mais facilmente demonstrável do que o fenómeno da possessão. Mediante o estudo de alguns tipos de energia e das suas leis, nos mundos ocultos, seria mais simples entender alguns mistérios do misticismo. Chegaríamos mais perto da natureza íntima das coisas e desvendaríamos mais alguns sectores do chamado mundo invisível, intangível ou "oculto".

De acordo com os casos observados, e segundo o nossos conhecimentos actuais, há quatro formas distintas e frequentes de manifestação de "personalidades intrusas". As religiões identificam-nas com entidades demoníacas capazes de provocar obsessão. No mundo científico, esta forma de intromissão na privacidade da pessoa tem recebido vários nomes consoante o grau de intrusão: crises depressivas, episódios neuróticos, etc. Em casos extremos, que podem estar associados à perda total do autodomínio. Esta personalidade intrusa, que nem sempre é um espírito que se encontra nos planos suprafísicos, como geralmente se pensa, entra em conflito ou impõe-se à personalidade "actual" gerando perturbações e fenómenos diversos.

Alguns "cientistas" ou "investigadores" insistem em atribuir todos estes fenómenos aos poderes da mente e do subconsciente, cuja natureza é indemonstrável, por causa dos seus preconceitos científicos ou religiosos. Nada mais conseguem senão bloquear as pesquisas sobre o assunto. Valorizam em excesso o poder da mente, tornada produto secundário de um órgão físico, o cérebro, em vez de procurarem entender o "homem real", que, sendo tão invisível como o "sol real", segundo a expressão de Max Heindel 2 , actua noutros planos de vibração.

A primeira forma de obsessão resulta de uma intromissão de um espírito (que mantém a sua consciência e vive nos planos suprafísicos) na consciência de uma pessoa "viva". Esta última assume então uma personalidade diversa da habitual. Chega a um verdadeiro processo de ruptura com a personalidade normal, devido ao fenómeno de substituição operada pela personalidade extrínseca, que passa a actuar como agente interno. O comportamento é determinado por esta segunda personalidade, totalmente assumida como novo centro de consciência. É capaz de controlar a linguagem e todas as reacções do corpo (excepto as reacções da iris aos estímulos luminosos), que utiliza facilmente para descarga de ódios antigos e satisfação pessoal, às vezes de modo desconcertante e escandaloso. Pode usar um processo que é vulgarmente conhecido por "incorporação".

A pessoa obcecada pode exibir sinais mais ou menos nítidos de transe. A expressão facial é, às vezes, surpreendentemente modificada, os gestos parecem estranhos e a voz é dramaticamente alterada. Pode falar uma língua estrangeira, escrever textos ininteligíveis, fazer desenhos obscuros, tornar-se alcoólico, etc.

Como a morte não altera os hábitos, uma vez que depois de o vício atingir as entranhas do corpo físico e a própria estrutura espiritual, o hábito transcende a vida física e o espírito mantém, no mundo invisível, a necessidade instintiva de usar, por exemplo, o alcool. Tem necessidade de obter esse estímulo de qualquer maneira 3 . E, para o conseguir, obceca pessoas sensíveis ou já viciadas, cujo corpo físico interpenetra aproveitando, por indução, das suas vibrações, e estimulando, ao mesmo tempo, a repetição do acto.

As consequências são dolorosas para a pessoa "viva". Passa a agir como se fosse uma "marioneta", servindo passivamente às ordens do obsessor, degradando-se física e moralmente.

A segunda forma de obsessão é estudada em pormenor por Max Heindel, na sua obra O Véu do Destino. Denomina-a "autopossessão" e relaciona-se com a acção do guardião do umbral e do corpo-de-pecado.

À terceira forma de obsessão poderíamos chamar também "auto-possessão", para a enquadrar na terminologia utilizada por Max Heindel, embora não assuma a gravidade dos casos relatados sob esta designação. Está associada à mente supraconsciente, que é onde se guardam todas as aquisições do passado, isto é, o depósito onde se arquivam os registos de todas as recordações e experiências adquiridas durante as vidas anteriores (a memória consciente e subconsciente apenas dizem respeito ao que se passa durante a vida actual). Aí permanecem diversas personalidades, vivas e dinâmicas, que o espírito desenvolveu durante a sua evolução.

Uma das antigas personalidades da pessoa pode emergir, em certos momentos, às vezes devido a uma sucessão de acontecimentos, e condicionar a personalidade actual durante o estado de vigília, ou até fixá-la num estádio anterior de desenvolvimento, passando a dominar o corpo físico, indiferente às condições do presente. Pode mesmo acontecer que várias dessas personalidades anteriores se manifestem e condicionem em simultâneo a mente actual, com os inevitáveis transtornos, ocultos pelas aparências, já que a consciência dificilmente poderá intervir.

Temos, finalmente, a quarta forma de actuação de "personalidades intrusas". É uma das mais comuns, embora se lhe dê pouca atenção. Está muito ligada, por exemplo, ao tabagismo e alcoolismo. Este tipo de intromissão manifesta-se mesmo entre vivos. De facto, as pessoas sensitivas podem incorporar, mesmo sem o saberem, através do mecanismo telepático, o condicionamento de hábitos alheios e apresentar um quadro clínico complicado, com doenças estranhas que resistem aos tratamentos habituais. Um dos casos que conhecemos relaciona-se com uma alergia, "induzida" ao "paciente" por uma pessoa das suas relações, sem solução duradoura pelo recurso à medicação. O assunto só foi resolvido definitivamente depois de o interessado recorrer ao "serviço de cura e auxílio espiritual" e ser esclarecido da causa da sua "enfermidade". Quem for mais resistente, ou menos sensível, poderá somatizar este tipo de influências sob a forma de dores de cabeça, tonturas, astenias, etc.

Estas observações estão de acordo com o que diz Max Heindel quando associa a doença à debilidade do corpo energético: o corpo vital. Em certos casos, os sintomas físicos podem ser uma forma de somatização de vibrações projectadas por outras pessoas "vivas".

Estes exemplos mostram-nos até que ponto somos vulneráveis à influência de personalidades que, embora invisíveis, se encontram presentes no mundo oculto. E leva-nos a pensar na existência de um "síndroma da imunodeficiência espiritual" e nas suas causas.

O melhor remédio contra este tipo de influência, como diz Max Heindel em O Véu do Destino, é, por um lado, aumentar o autodomínio e, por outro, "educar as pessoas acerca da verdade do facto de que a morte, da mesma forma que a vida, é uma coisa natural, comum e corrente, na eterna vida do espírito imortal, fazendo tudo quanto esteja ao nosso alcance para divulgar o mais possível este evangelho da vida".


Francisco Coelho


Notas:

1A cólera é um arrebatamento grosseiro, que rebaixa a pessoa ao nível da causa que o excitou.
2Max Heindel, Conceito Rosacruz do Cosmo, 2ª ed., pág. 209
3Max Heindel, Id., 2ª ed., pág. 87.

Nota do editor : O conceito de Obsessão aqui abordado se refere à Obsessão devido à ação de personalidades intrusas, ainda não reconhecido pela Ciência Acadêmica, que reconhece apenas o  conceito psicopatológico de Obsessão , a  Neurose Obsessiva Compulsiva, transtorno neurótico, sujeito a tratamento psicoterápico e psicofarmacológico.

- Fonte: Revista "Rosacruz", Fraternidade Rosacruz de Portugal

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